17 de jan. de 2012

O crack

A operação do Governo Kassab (municipal) e Alckmin (estadual) na capital paulista denominada “Plano de Ação Integrada Centro Legal” contra os usuários de crack na região da Luz parece muito com a ação do (des)Governo Hélio aqui em Campinas desencadeada em 2010 denominada “Bom dia morador de rua/Tolerância Zero”.


Ambas se deram num período de pré-campanha eleitoral. Como aqui em Campinas, querem resolver em São Paulo um problema complexo com soluções simples, pontualmente e de forma imediata. Sabem que a operação não irá resolver o problema, assim como não resolveu em Campinas. Querem na verdade maquiar uma situação e tirar proveitos políticos e econômicos disto. Creio que em São Paulo não será diferente.


O crack continuará sendo um tormento na cidade, enquanto não oferecerem, tratamento condizente com a realidade dos usuários, não colocarem a inteligência das políticas civil e militar para investigar qual a fonte da droga e prender os traficantes e enquanto não entenderem que o problema deve ser enfrentado por todas as áreas do poder público e não só como caso de polícia. Vamos esperar pra ver, ...as eleições, a prestação de contas das campanhas, o tribunal de contas, ... a ou as cracolandias.

Paulo Roberto dos Santos

Campinas, 17 de Janeiro de 2012

13 de jan. de 2012

Estética, ética e o crack

“Meia casquinha do Bob’s, uma paçoquinha de 1,99 e uma pedra de crack é tudo o que eu consumi hoje tio” disse um menino que atendi outro dia. Ele estava magro como um palito, olhos fundos, sujo, descalço com um grande furúnculo no pé, roupas rasgadas...

Eu poderia descrever aqui mais uma porção de detalhes sobre esse adolescente. Deixo o resto por conta da imaginação de vocês. Creio que vão conseguir chegar bem perto da realidade. Com essa imagem que temos do adolescente em situação de rua, usuário de crack, quero partilhar algumas reflexões que faço sobre esses meninos e sobre a intervenção de Kassab e Alckmin em São Paulo na cracolândia, região da Luz.

Primeiro sobre a situação de rua, de todas as situações que já vivenciei aqui no Conselho e mesmo antes, trabalhando como educador social e orientador de medida, a criança/adolescente que se encontra nesta situação está porque de alguma maneira foi vítima de violência, seja em casa, seja na sua comunidade de origem. Nunca atendi situação de pessoa em situação de rua por hobby, lazer, etc. Antes de qualquer coisa, a pessoa em situação de rua, é vítima de uma sociedade excludente, discriminatória, divida em classes.

Em segundo lugar faço alguns apontamentos sobre a violência, um dos fenômenos mais complexos na sociedade contemporânea. A violência se revela na sociedade de diversas maneiras, no contexto da população de rua destaco duas categorias, digamos assim: a violência doméstica (física, psicológica, sexual, negligência e fatal) e a violência do crime organizado, o tráfico de drogas. A primeira por ser talvez a que mais leve as pessoas a se estruturarem na rua e a segunda por ser a que eles se inserem com o consumo de drogas, sobretudo o crack. Saem de uma situação de violência e entram em outra.

Uma terceira questão que se faz necessário pensar é a dos direitos humanos para com a população de rua. Ao se estruturar na rua a pessoa tem todos os seus direitos violados, ora porque nem ela mesmo sabe que os tem, ora porque a sociedade ignora tal situação, ora porque o Estado se exime de suas responsabilidades. Destaco o exemplo do menino que eu cito no início deste texto. Na ocasião ele havia sofrido uma crise de epilepsia, ficou horas na calçada em pleno centro da cidade, as pessoas passavam indiferentes, ninguém o socorria até que um outro menino em situação de rua pediu ajuda para um guarda de trânsito. Ao receber socorro, o Samu não tinha vaga em nenhum hospital da cidade. Fez o primeiro atendimento e depois não tinha para onde levá-lo. Na verdade sabemos que os hospitais resistem ter que atender esta população. No âmbito da saúde as políticas públicas para este população é ínfima (o Estado se exime de suas responsabilidades). Passado toda aquela situação, conversando com o adolescente, ele me disse: “tio, se não fosse você os verme nem ia me ajudar, valeu tio!”, ou seja, o adolescente me agradecendo como se eu tivesse feito algum favor, eles mal sabem os direitos que têm. Aquele era nada mais, nada menos que meu dever de oficio.

Com esse apanhado e também a partir da minha vivência como educador social e como conselheiro tutelar, quero dizer o que penso sobre as investidas do (des)Governo Kassab e Alckmin em São Paulo na cracolândia. Acredito que o enfrentamento ao crack deve ser feito por meio de intervenções do Estado, articulada em todas as esferas da federação, em diversas políticas sociais – e não só a da segurança pública – e de maneira continua. Do contrário qualquer ação do Estado se faz ineficaz. Por outro lado, mais me parece que o objetivo do prefeito não é resolver o problema social e sim maquiar a situação. A população que lá está irá se instalar em outras áreas, talvez migrar para outras cidades, mas continuarão usando crack, em situação de rua. É preciso enfrentar o problema como efeito e não como causa, a cidade não está feia por causa da população de rua em uso de crack, a cidade está feia porque o Estado não se fez presente e o tráfico de drogas se instalou como um estado paralelo. Não é um problema de estética! É um problema social e político! Talvez alguma aula de ética ajude Kassab e Alckmin entender isso.

Paulo Roberto dos Santos – Paulinho

Campinas, 13 de Janeiro de 2012